O Presidente da República, em 30 de setembro, lançou o Decreto 10.502/2020 que institui a nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE). O governo federal, mais uma vez, não ouviu os movimentos sociais organizados, como os conselhos de participação, as entidades de pesquisa, Universidades públicas e Institutos Federais de Educação, entidades de pesquisa, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.

Em defesa da nova PNEE, o ministro da educação, Milton Ribeiro, afirmou que “um dos principais norteadores dessa política nacional é a valorização das singularidades e dos direitos dos estudantes e das famílias no processo de decisão sobre as alternativas mais adequadas para o atendimento educacional especializado”.

 

                                                                                                                                              Alguns norteadores da PNEE

“Conjunto de medidas” – No decreto, a educação não é concebida como política pública, o que se propõe é um “conjunto de medidas planejadas e implementadas com vistas a orientar as práticas necessárias para desenvolver e facilitar o desenvolvimento […]”.

A nossa prática na escola mostra a necessidade não de um conjunto de medidas, mas da adoção de políticas públicas consistentes, com investimentos que garantam a formação dos profissionais da educação, a infraestrutura necessária à inclusão equitativa, a valorização das singularidades etc.

“Adesão voluntária” – O texto legal fala em “adesão voluntária dos serviços educacionais”, ideia que reforça o descompromisso com políticas públicas. A adesão voluntária remete à defesa da não obrigatoriedade do setor público em garantir em sua rede pública de educação regular as condições necessárias de acolhimento das pessoas com deficiência.

Caberá ao setor privado a inclusão? Se o governo não desviar verba destinada à escola pública para as escolas particulares, isso não acontecerá. Elas, há muito tempo alegam não terem condições de acolher essa população. Sabemos que sempre foi difícil matricular uma criança com deficiência em escola particular regular apesar das determinações legais existentes. E agora com a adesão voluntária?

Quem trabalha ou trabalhou em escola pública conhece as dificuldades das famílias.

Caberá a elas a decisão sobre a alternativa mais adequada à educação dos seus filhos e filhas? Diante da escassez de oportunidades, qual decisão irão tomar? Poderão optar por deixar o filho ou filha em casa?

“Aprendizado ao longo da vida” – Já conhecemos essa proposição nos currículos oficiais do Estado. Ele serve apenas para justificar a oferta de serviços de baixa qualidade como currículos empobrecidos.

 Essa proposta não atende a todas as dimensões do direito à educação determinado na nossa Carta Magna: acesso, permanência e qualidade

O Decreto 10.502/2020 da nova PNEE trata a Educação Especial a partir de paradigmas superados, a integração e isolamento. Ninguém é contra que os estudantes com deficiência tenham, por exemplo, no contraturno, aulas em instituições específicas, entretanto, não podemos privá-los de vivenciar a alegria de conviver com os demais.

O decreto desrespeita, entre outros documentos legais, a Convenção Internacional Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada à Constituição do Brasil e o Estatuto da Pessoa com Deficiência, todos estabelecem o direito à plena inclusão e asseguram a necessidade de sistema educacional inclusivo em todos os níveis.

O decreto não está alinhado ao paradigma da educação inclusiva, fundamentada pelos princípios de uma sociedade democrática e garantia dos direitos fundamentais de todos os cidadãos e cidadãs, sem preconceitos, quer sejam em razão de deficiência, raça, etnia, gênero, sexualidade ou classe social.

Maria Claudia V. Junqueira – Coordenadora do Encontro de Representantes de Escola