O Ministério da Educação do governo Michel Temer excluiu menções ao combate à discriminação de gênero da nova versão da Base Nacional Comum Curricular.

A pasta incluiu esse tema na parte de ensino religioso, para que se discuta nas escolas concepções de “gênero e sexualidade” de acordo com as tradições religiosas. Educadores criticam a medida.

A Folha teve acesso à nova versão da base, encaminhada ao CNE (Conselho Nacional de Educação) na semana passada, dia 29. O MEC se recusou a divulgá-la. O documento passa agora por uma análise final do conselho.

A base define aquilo que os alunos devem aprender, a cada ano, na educação básica. Só a parte que vai da educação infantil ao ensino fundamental está em discussão. A discussão sobre ensino médio foi congelada pelo governo.

A proposta de currículo que a gestão Temer tenta aprovar contém pontos revisados pelo ministério a partir da terceira versão, que havia sido mandada ao CNE em abril. O texto tem recebido sugestões de emendas de conselheiros em todas as áreas.

O MEC já havia retirado, sem alarde, três menções ao respeito à identidade de “gênero” e “orientação sexual” da terceira versão da base. Agora, a Folha identificou ao menos dez trechos suprimidos pela equipe do ministro Mendonça Filho (DEM-PE).

Já na introdução, um texto que elencava as dez competências gerais da base indicava que as escolas deveriam valorizar a diversidade, “sem preconceitos de origem, etnia, gênero, idade, habilidade/necessidade, convicção religiosa”. Na nova versão, só se fala em “preconceitos de qualquer natureza”.

Para Andréa Gouveia, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, a atitude fere um compromisso da escola com a tolerância.

“Não nomear aquilo que são as desigualdades e preconceitos reforça visões conservadoras de que os preconceitos não existem”, afirma.

A abordagem de temas sobre identidade de gênero pode, segundo estudiosos, influenciar na discussão de problemas sociais como violência contra a mulher, gravidez na adolescência e homofobia.

Priscila Cruz, do Movimento Todos Pela Educação, diz que as ausências comprometem a existência de um currículo de qualidade. “Não é o caso de rechear a base com a questão de gênero, mas essa é uma questão contemporânea, por isso importante.”

Grupos religiosos e conservadores têm se mobilizado contra o que chamam pejorativamente de “ideologia de gênero” na base –termo que nunca esteve presente.

A pressão também foi exercida por parlamentares da bancada evangélica, que integra a base do governo no Congresso. Eles afirmam que a discussão poderia destruir a identidade dos jovens.

Confira a íntegra da reportagem.

Fonte: Folha de S. Paulo (Paulo Saldaña)