Divulgadas pelo Instituto Nacional de Estudos é Pesquisas Educacionais (Inep), do Ministério da Educação, as notas por escola do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2014 apresentam poucas diferenças com relação às do ano anterior. Ou seja, o cenário do sistema educacional continua preocupante. Segundo o Inep, as escolas particulares continuaram à frente das escolas públicas e a distância entre elas vem diminuindo muito lentamente. Nas provas objetivas, o desempenho médio em linguagem, ciências humanas e ciências da natureza registrou pequeno aumento, mas o índice de aproveitamento em matemática caiu 33 pontos. O levantamento do Inep é realizado com base nas notas obtidas nessas provas por 1.295.954 alunos de 15.640 escolas públicas e privadas. As provas avaliam competências essenciais, como leitura, interpretação de textos, raciocínio matemático, capacidade de relacionar conhecimentos de diversas áreas e habilidade para resolver problemas.

 

O levantamento do Inep também mostra que a rede pública de ensino médio obteve na avaliação de 2014 uma média 7% menor do que a rede particular. E, das 770 escolas públicas onde estudam os alunos  com nível socioeconômico mais baixo, 27% não alcançaram a nota mínima – 450 pontos – para ter acesso ao programa de Financiamento Estudantil (Fies). Trata-se de uma contradição, pois o programa foi concebido para atender estudantes que não têm condição de pagar mensalidades em universidades privadas. “Essas escolas negam o acesso de seus alunos, que são muito pobres, ao ensino superior. Eles dependem do Fies para serem admitidos em alguma instituição particular”, diz a diretora do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz.

 

Como nas edições anteriores do Enem, as escolas públicas mais bem classificadas são localizadas em cidades de porte médio dos Estados mais desenvolvidos ou vinculadas às Faculdades de Educação de universidades federais e estaduais e às Forças Armadas. As escolas públicas com as médias mais altas foram o Instituto Federal do Espírito Santos, os Colégios de Aplicação das Universidades Federais de Viçosa, Santa Maria e Pernambuco, o Colégio Militar de Belo Horizonte e a Escola Preparatória de Cadetes do Ar de Barbacena. Entre as 20 escolas mais bem classificadas no ranking, todas são particulares.

 

Avaliações de qualidade e rankings de desempenho servem como parâmetro para as autoridades educacionais. Eles são importantes para viabilizar um conjunto integrado de ações, em termos de distribuição de recursos, fixação de metas e análise de resultados. No caso específico do Enem, contudo, o ranking das escolas apresenta distorções.

 

Em primeiro lugar, ele inclui escolas de contextos socioeconômicos distintos – e, como advertem os pedagogos, não se pode comparar escolas públicas e escolas privadas sem interpretar as especificidades de cada uma delas e as regiões em que estão situadas. Em segundo lugar, mais preocupados com marketing do que com a qualidade do ensino que oferecem, alguns grupos educacionais maquiam os resultados do Enem. Eles promovem treinamentos específicos, atraem na reta final do ensino médio os melhores alunos de outras instituições, reúnem os melhores alunos da rede numa pequena turma e afastam os estudantes com pior rendimento das turmas submetidas à avaliação. Na edição de 2013, um grupo educacional chegou a criar um novo CNPJ para submeter uma turma de elite às provas do Enem. Ela foi classificada entre as primeiras posições, mas as demais unidades do grupo ficaram em 569º lugar no ranking de qualidade.

 

Para atenuar essas distorções, o Inep fixou um número mínimo de alunos por escola avaliada e criou o indicador de permanência, que mostra o porcentual de alunos que cursaram o ensino médio na mesma escola. Essas medidas são importantes, mas o ranking do Enem ainda não retrata fielmente a realidade da rede de ensino médio. Por isso, como os próprios técnicos do Inep reconhecem, ele tem de ser interpretado com cuidado.

 

Editorial O Estado de São Paulo, publicação desta segunda-feira (10), página A3.