Uma pendenga se arrasta nos tribunais tendo as empresas de convênio médico no centro de mais um capítulo de idas e vindas jurídicas. Na terça-feira, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) anunciou a suspensão da venda de 246 planos de saúde de 26 empresas por irregularidades que vão do descumprimento de prazos para marcação de consultas a negativas de coberturas de procedimentos. A punição, no entanto, não foi adiante. No mesmo dia, a Fenasaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar) obteve na Justiça liminar que suspendia a medida. Pelo despacho judicial, a ANS precisa rever a reclamação dos usuários antes de impor a suspensão da comercialização dos planos. Na sexta-feira, conforme decisão da Justiça, a ANS decidiu liberar todos os planos da suspensão e fará o recálculo para determinar que planos devem ser suspensos.
A discussão, se é correto ou não o cálculo das reclamações dos usuários para justificar a punição, deveria estar em segundo plano. Porque o que de fato interessa nessa lenga-lenga é a forma como os planos de saúde tratam seus clientes. Tem virado lugar – comum nesse mercado a velha tática de criar dificuldades para vender facilidades, o que é uma estratégia comercial que se deve condenar.
A quantidade absurda de planos de uma mesma operadora, por exemplo, revela essa intenção, na medida em que cria limites e barreiras para uma série de atendimentos. Cada plano tem um dificultador, o que nem sempre é de conhecimento do cliente quando assina sua adesão. Essas coisas só costumam ser descobertas no momento em que o cliente precisa do plano e se vê órfão diante da emergência. Quem não conhece alguém que não tenha uma história triste como essa para contar?
Não por acaso, a rotina de abusos dos planos de saúde contra segurados tem dado às operadoras a nada honrosa liderança no ranking das reclamações que chegam ao Idec (Instituto Brasileiro do Consumidor). No último levantamento, em 2012, as queixas contra os convênios responderam por 21,8% das denúncias encaminhadas à entidade, percentual que supera as reclamações contra os bancos (20,5%) e as empresas de telefonia (17,5%). Essa guerra de liminares que ora tramita na Justiça, na verdade, funciona como cortina de fumaça para as falhas na regulação dos planos de saúde. Afinal, é a mesma ANS que autoriza o registro e a venda de planos ruins e, depois, os denuncia à Justiça. O problema está na liberação de planos que jamais poderiam ser aprovados, pois se revelam, de cara, insuficientes para cumprir o que prometem.
É preciso, pois, que a regulamentação desses convênios passe por uma depuração. A continuar como está, sem punição para operadoras que excedem sua clientela além da capacidade de atendê-la, o serviço oferecido na rede privada estará tão débil como o do SUS, historicamente marcado por longas filas de espera e atendimentos clínicos que podem demorar meses. Neste caso, o caminho mais indicado para ANS é seguir um velho ditado que ensina que é melhor prevenir do que remediar.
Editorial do jornal Diário de São Paulo, de ontem (domingo, 25).
SECOM/CPP