Estudo recentemente publicado por pesquisadores (as) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) – confirma que na ausência da rotina escolar, jovens estudantes de escolas públicas da Grande São Paulo que passam mais tempo diante de telas e trocam a noite pelo dia apresentam com mais frequência sintomas de depressão e ansiedade na pandemia de covid-19.
O grupo interdisciplinar constatou que estudantes do 9.º ano do ensino fundamental e do ensino médio de escolas públicas estaduais e municipais, localizadas nas periferias dos municípios de São Paulo e Guarulhos, apresentaram triagem positiva em 10,5% para depressão e 47,5% para ansiedade. O critério adotado foi o Inventário de Depressão Infantil e de Ansiedade pelo SCARED (Screen for Child Anxiety Related Emotional Disorders).
“Outros fatores revelaram estar relacionados a esses quadros. Quem avalia que o conhecimento adquirido na escola é importante tende a ter menos sintomas de depressão. Quem teve caso de covid-19 em casa apresentou mais sintomas. Essas tendências também se verificaram em relação à ansiedade, mas testes estatísticos não puderam confirmar efeito consistente”, explica Daniel Arias Vazquez, professor e pesquisador da Unifesp.
A equipe da Unifesp responsável pelo artigo Vida sem Escola e a saúde mental dos estudantes de escolas públicas durante a pandemia de Covid-19, publicado como preprint pela plataforma Scielo, é multidisciplinar e intercampi. São autores(as) do estudo os(as) professores(as) Daniel Vazquez, Sheila Caetano, Rogerio Schlegel, Elaine Lourenço, Ana Nemi, Andrea Slemian e Zila Sanchez, especialistas em educação, psiquiatria, políticas públicas e epidemiologia, oriundos(as) dos departamentos de Ciências Sociais, História, Psiquiatria e Medicina Preventiva da Unifesp.
O Centro do professorado Paulista procurou Ismael Rocha, diretor acadêmico do Iteduc (Institute of Technology and Education), organização pioneira na capacitação de
professores de educação básica para o ensino on-line e híbrido e Doutor em Educação PUC-SP, para explicar as consequências da pandemia do Covid-19 no cotidiano dos estudantes do 9º ano do ensino fundamental e do ensino médio das escolas públicas da periferia de São Paulo.
Segundo o diretor do Iteduc, os meses de isolamento representam uma enorme mudança na rotina dos estudantes Muitos deles enfrentam forte estresse, com solidão e dificuldade em acompanhar as aulas online.
“É importante reforçar que nossos meninos e meninas não estiveram de férias nesse tempo que passaram fisicamente longe da escola. É necessário ajustarmos nossas lentes para enxergarmos a situação real desses jovens. Imagine que você está vendo um filme e pausa em um determinando momento. Quando retorna, é preciso resgatar uma série de pontos para poder construir novamente a lógica apresentada. Por vezes, seria mais fácil começar novamente do início, para o melhor entendimento da narrativa.
Fazendo uma analogia com a educação, ocorre da mesma forma. Existe uma construção mental para todos os processos de ensino-aprendizagem. Pense, agora, em uma criança ou adolescente que parou de estudar durante um ano. Na verdade, para alunos da escola pública, em sua maioria, muito mais que um ano. Porém, diferente de um filme, a narrativa na educação não é linear, mas multifatorial. Ou seja, agrega nas diferentes áreas do conhecimento. Pois bem, é preciso concordar que este aluno ou aluna vai ter enormes dificuldades quando retornar fisicamente à escola. Será difícil resgatar, de imediato, o mesmo empenho que tinha anteriormente. Isso porque o conhecimento não é cumulativo. Não acontece como se estivéssemos empilhando caixas de diferentes tamanhos e cores. E com o agravante de que se trata de mais do que um ano perdido, e não de um único ano perdido” – ressalta Ismael.
Para o especialista os impactos desse processo são incalculáveis e destrutivos. “Imaginar que o que estamos vivendo não terá repercussões na sociedade e no País é desmerecer a História. Para começar, temos de lidar com o abandono escolar. Vários estudos mostram que o percentual de estudantes que retorna aos estudos, depois de parar durante um ano, é pequeno.
Na esfera socioemocional, o impacto é enorme já que o estudante tem dificuldade em processar todas as variáveis envolvidas para retornar à rotina anterior. Eles perderam a sintonia com a dinâmica do ensino-aprendizagem; eles perderam a prática do relacionamento, da ssária nesta faixa etária.coletividade, que produz aprendizados importantes; eles perderam a disciplina embutida no cotidiano, tão necessária nesta faixa etária e este é o grande impacto socioemocional!
Antes de querer mitigar o déficit de disciplinas como História, Geografia, Língua Portuguesa…é preciso acolher e entender esse aluno no seu todo. É preciso compreender suas perdas, medos, inseguranças e as dificuldades que encontram nos seus relacionamentos nesse período de volta às aulas. Imaginar que as crianças e jovens não enxergam tudo isso é um grande equívoco. É fato: se não olharmos primeiro o ser humano, os danos serão ainda maiores.
Infelizmente, sem nos debruçarmos sobre todos os impactos da pandemia para as crianças e jovens, o cenário da educação básica, no futuro, ficará ainda mais comprometido”, conclui o especialista em educação.
Sobre a fonte: Ismael Rocha é diretor acadêmico do Iteduc (Institute of Technology and Education), organização pioneira na capacitação de professores de educação básica para o ensino on-line e híbrido. É Doutor em Educação pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), especializado em avaliações escolares. É mestre em Sociologia, com formação complementar nos EUA, Canadá, Inglaterra, China, Malásia, Chile e México. Vice presidente e Coordenador do Comitê de Sustentabilidade da World Vision Brazil, foi também diretor ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) por 18 anos.
Sobre o Iteduc: O Institute of Technology and Education é uma organização voltada para o ensino híbrido e pioneira em capacitar professores de educação básica para o ensino online, ressignificando a sala de aula.