Coletiva de imprensa/Reprodução

Governador fez discurso incisivo em favor da vida; argumentos refletem orientações de especialistas e lideranças mundiais


O governador João Doria (PSDB) anunciou nesta segunda-feira (6) a prorrogação da quarentena no estado de São Paulo até 22 de abril, para evitar a disseminação do novo coronavírus. Atualmente, o estado tem 4.620 casos confirmados e 275 óbitos. Em coletiva de imprensa no Palácio dos Bandeirantes, o tucano fez discurso incisivo em favor da vida, recorrendo a orientações de especialistas em saúde pública e mencionando falas de lideranças mundiais, como o papa Francisco.

“A vida vem antes do lucro. Dinheiro tem que servir, não governar. As palavras são do papa Francisco”, disse o governador. Antes, ele reforçou que as ações do governo são pautadas pela ciência e amparadas na opinião médica desde o início da crise. “Saber ouvir é tão importante quanto saber falar. Mas é preciso ter humildade para saber ouvir, sobretudo em tempos em que alguns gostam de impor as suas vontades e ameaçam aqueles que têm posição contrária. Este é o momento de ouvir a palavra da ciência, a palavra dos médicos, a palavra daqueles que conhecem.”

Doria destacou que há consenso médico mundial para isolamento como forma de salvar vidas. “Não são apenas autoridades brasileiras. É a Organização Mundial da Saúde (OMS), são médicos, profissionais e agentes de saúde da maioria dos países do mundo, que já se manifestaram a favor do isolamento.”

Nacionalmente, o governador respaldou a medida a partir de recomendações de lideranças diversas. “No Brasil, quero lembrar, defendem o isolamento: o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o ministro da Justiça, Sergio Moro, o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, o Centro de Estudos do Exército Brasileiro, e, repito, a maioria dos médicos e cientistas.”

O tucano também inseriu no discurso uma referência econômica, baseada no pensamento de Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel da Economia (2001), que concedeu entrevista neste final de semana ao jornal O Estado de SP. “A economia será devastada se não salvarmos as pessoas”, parafraseou Doria, afirmando que lucros podem esperar, visto que a vida vem antes do dinheiro.

O governador encerrou a fala em tom crítico aos que pedem reabertura do comércio no estado. “Àqueles que me pressionam por WhatsApp, telefonemas e cartas, para que possamos agir contra os nossos princípios e contra os princípios da medicina, pergunto: vocês estão preparados para assinar os atestados de óbito de brasileiros, para carregar caixões e enterrar as vítimas do coronavírus?”

RESPALDO CIENTÍFICO

A coletiva foi planejada com o Centro de Contigência de Coronavírus de SP e teve a presença de especialistas em saúde. O infectologista David Uip, coordenador do centro, destacou que a equipe é formada por técnicos renomados. “Todos os dias nos reunimos, discutimos, e as nossas conclusões são passadas ao secretário de Saúde e ao Governo do Estado.

A fala foi exemplificada pelo doutor Luiz Fernando Aranha, integrante da equipe e infectologista do Hospital Albert Einstein. “O comitê que assessora o governador começou com o entendimento inicialmente intuitivo de que o distanciamento social mais ampliado, mais radical, teria papel fundamental no impacto da epidemia sobre o cidadão comum, pelo simples fato de que a doença é transmissível entre as pessoas. Depois, tivemos um segundo momento, em que a literatura médica confirmou nossas impressões. E o momento atual é de observar os resultados benéficos, tanto em dados do estado, como do município e dos locais em que cada um de nós trabalha.”

Posteriormente, Uip deixou um depoimento à imprensa. Ele testou positivo para a covid-19 em 23 de março e ficou 14 dias em isolamento, afastado das atividades no Governo do Estado. 

“Há dois domingos eu me senti muito mal. Eu não consegui falar, estava extenuado. Fiquei sentado numa cadeira e pela primeira vez na vida eu me neguei a falar a uma emissora de televisão. Não consegui. De domingo para segunda, passei muito mal. Na segunda de manhã fui fazer o exame e a tomografia. O exame deu positivo, a tomografia, normal. A semana que seguiu foi de extremo sofrimento. Na segunda seguinte, voltei a fazer o exame e outra tomografia, e nesta apareceu a pneumonia”, afirmou.

Segundo ele, o sentimento foi de muita angústia, de dormir sem saber como iria acordar, além do isolamento. “Não é fácil, é de extremo sofrimento, mas absolutamente fundamental. Tive que me reinventar. Tive que criar um David novo, seguramente mais humilde e sabendo dos limites da vida.”

EMPREGO DE FORÇA POLICIAL 

O governador alertou que aderir à prorrogação da quarentena é obrigatório, sob possibilidade de intervenção policial em caso de desobediência. “Guardas poderão agir imediatamente para que haja dissipação de qualquer aglomeração. É uma medida que será publicada no Diário Oficial do Estado de amanhã (7) e deverá ser rigorosamente seguida pelas prefeituras”, concluiu.

A intervenção terá caráter instrutivo, não compreendendo multa ou sanções mais rígidas para estabelecimentos. Cidadãos, entretanto, poderão ser penalizados de acordo com a lei, o que inclui detenção.

Na cidade de São Paulo, porém, estabelecimentos que descumprirem as normas poderão ser lacrados e ter cassado o alvará de funcionamento, em situação de reincidência. A medida foi anunciada pelo prefeito Bruno Covas (PSDB), que participou da coletiva.

Confira a íntegra do pronunciamento do governo.