Wagner Pulzi
Tem sido muito comum encontrarmos pais transferindo a responsabilidade para as instituições de ensino quando o assunto é educação, não se dando conta que, ao assim fazerem, acabam por terceirizar uma responsabilidade inerente aos próprios pais.
A educação não é apenas um dever legal dos pais, como também ético. Seja por motivos que vão desde a negligência até a busca incansável pela felicidade, estamos vivendo em uma época onde as obrigações dos pais entram em conflito com os seus próprios desejos e anseios. Simplesmente transferem a responsabilidade de educar os filhos para escola (acreditam não terem essa obrigação) ou querem evitar a frustração a todo custo, responsabilizando a mesma pelos fracassos e até possíveis traumas na vida das crianças, não aceitando que seus filhos sejam alvo de críticas ou que a falta de êxito dos mesmos ocorra em determinados momentos (os filhos devem ser perfeitos e invulneráveis).
Não obstante, os próprios professores estão sendo cobrados por uma responsabilidade concernente aos pais. Parece que já não basta mais o trabalho atribulado dos professores, sendo necessário cobrá-los excessivamente pelo desempenho dos alunos. Não se admite dentro da pedagogia atual o fracasso por parte do aluno. O aluno, como centro da aprendizagem, é sempre a “vítima”. O professor torna-se o vilão. Agora, em relação aos pais, pouco ou nada se fala, exceto quando encontramos aqueles textos cuja temática “mais do mesmo” romantiza a relação ensino-aprendizagem ou encontramos alguns excertos sobre o papel da família como se estivéssemos lendo ensinamentos em livros de autoajuda.
Quando analisamos a questão das responsabilidades dos pais através das leis, encontramos já na Constituição Federal de 1988 (CF) os seguintes dispositivos:
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
“Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
Destaco em negrito uma parte do disposto no Art. 229, pois erroneamente (talvez por questão interpretativa), muitos ainda acreditam que o Estado é o principal responsável pela educação, cabendo aos pais unicamente matricular os filhos na rede regular de ensino, conforme preconiza o Art. 55 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990). Todavia, deve-se enfatizar que o Art. 229 da CF evidencia a responsabilidade dos pais na assistência, criação e educação dos filhos menores, bem como no próprio Estatuto da Criança e do Adolescente em seu Art. 129, inciso V, reitera-se a obrigação dos pais em matricular os filhos na rede regular de ensino, como acrescenta ser de sua responsabilidade o acompanhamento da frequência e do rendimento escolar.
A família é a primeira instituição apresentada à criança e no seio da família a criança deve estar a salvo de toda forma de negligência, não restando qualquer dúvida quanto à responsabilidade da educação no âmbito do Código Civil (Lei no 10.406/2002), conforme observamos no Art. 1.634 da referida lei:
“Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584”.
Ainda, o Código Penal (Decreto-Lei no 2.848/1940) estabelece como crime contra a assistência familiar o chamado “abandono intelectual”, conforme observamos:
“Art. 246 – Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa”.
E valendo-me novamente do Estatuto da Criança e do Adolescente, destaco nos seguintes dispositivos a responsabilidade dos pais na educação dos filhos menores, de acordo com a referida lei:
“Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta Lei.
Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais”.
Não restam dúvidas quanto à responsabilidade dos pais na educação dos filhos no que diz respeito à legislação, da mesma forma que é um direito da criança ser criada no seio familiar e ser assistida por seus pais, não eximindo os mesmos de suas obrigações em uma situação de separação, divórcio ou dissolução da união estável, aplicando-se a mesma responsabilidade no que diz respeito aos filhos adotivos.
Vale ressaltar que a assistência prestada aos filhos não deve ocorrer apenas materialmente, pois a criança é um ser dotado de sentimentos e emoções, de capacidades e habilidades a serem desenvolvidas e aprimoradas, necessitando também da presença, do afeto e do preparo necessário para a vida em sociedade e, futuramente, para o mercado de trabalho, o que necessariamente implica em educação. Negligenciar a educação, portanto, é colocar a criança em situação de abandono.
Ainda, devemos considerar que cuidar dos filhos é um dever ético. Independentemente de como a criança foi inserida no seio familiar, seja fruto de um relacionamento de um casal, adotada ou até mesmo pela da técnica de reprodução assistida para casais homoafetivos e mães que desejam continuar solteiras, a vida de uma criança não é brincadeira. Essa criança necessitará de todos os cuidados para desenvolver-se de forma saudável, necessitará de atenção, afeto, educação e orientações para a vida.
Nenhuma criança pede para vir ao mundo e, como citado anteriormente, ela é fruto do relacionamento humano. Independente da forma como foi gerada, essa responsabilidade será sempre da família, pois foi esta que a concebeu ou assumiu a responsabilidade por essa vida. Ninguém disse que é fácil a criação dos filhos, mas eximir-se dessa responsabilidade é inadmissível. Ao “empurrar” essa responsabilidade para outros seria a mesma coisa que dizer que os outros geraram essa vida, o que não é verdade.
É compreensível que, no ritmo frenético da atualidade, muitos pais exerçam atividades com uma extensa carga horária diária, necessitando cada vez mais das escolas em tempo integral ou delegando essa tarefa aos avós. Todavia, não é motivo para que os pais se ausentem integralmente da vida dos filhos, comparecendo apenas por conveniência ou para tentar suprir essa ausência apenas materialmente.
Assim, infelizmente temos pais negligentes em vários aspectos, sendo omissos em muitos casos, ou acreditam que cumprindo uma obrigação material estarão fazendo o suficiente, ou até mesmo encontramos aqueles que, entoando a felicidade como uma espécie mantra, tentam ao máximo evitar qualquer frustração, agradando de todas as formas possíveis, não impondo limites e chegando ao ponto de vociferar contra qualquer um que critique seus filhos, mesmo que construtivamente.
Parece-me óbvio que, devido esse fato, a carreira docente encontra-se em uma situação delicada, pois muitos desses filhos não respeitarão os professores. Se a criança vítima da negligência como o abandono ou maus tratos pode ser um desafio para os professores, o que dizer daquelas criadas em uma “bolha antifrustração”, cujos pais satisfazem todas as suas vontades, seja por mero mimo ou simplesmente por ser mais fácil satisfazer do que educar?
Dessa forma, não tenho como não lembrar de Içami Tiba quando este afirma que a tarefa de educar não deve ser delegada somente à escola, pois aluno é transitório e filho é para sempre.
E uma vez que a educação é um dever ético dos pais, sabiamente as leis responsabilizam os mesmos por ela. É claro que precisamos das leis para regulamentar a vida em sociedade, mas acredito que pessoas com caráter não precisariam ser acionadas legalmente para serem responsáveis. A educação é uma responsabilidade dos pais, independente de qualquer lei que assim o exija.
Wagner é mestre em Educação Física (Educação, Escola e Sociedade).
Que bom ter uma pessoa com acesso público para expor tudo que deve ser necessário ,ser realizado para todos saberem de suas responsabilidades sem negligenciar e mascarar. Filhos NÃO foram feitos para serem jogados e sim cuidados.
Obrigada Vagner
Sou Professora seletivada, e fui contratada pra Escola onde eu moro. Mas a mãe dos alunos não me aceita. O que devo fazer, se não é por conta de despreparo. Mas sim por, motivos pessoais, o que devo fazer
tenho total monitoramento sobre meus filhos, sei onde estão e com quem conversam o tempo todo…
tudo isso pelo aplicativo bruno espião. foi maravilhoso na minha vida.
https://brunoespiao.com.br/espiao-de-celular-gratis
Pretendo defender em meu TCC em Pedagogia a não atribuição da responsabilidade EXCLUSIVA aos professores pela formação étcio-moral dos educandos, por entender que essa educação é dever da Família e depois Estado. O professor é um ser humano como todo outro qualquer, sujeito às instabilidades da vida como todo cidadão, portanto, não deve ter sobre si uma responsabilidade que também é e começa no seio familiar. Escola pública hoje tornou-se um depósito de crianças mimadas, maltratadas, abandonadas etc, e nosso políticos querem resolver o problema jogando mais essa responsabilidade para os professores, sem os da a autonomia necessária, cobrando resultados e desvalorizando-os cada vez mais.
É claro que esses devem sim ser COLABORADORES, EXEMPLOS na educação ético-moral dos alunos, mas não os únicos responsáveis, visto as legislações que algemam e amordaçam nossos professores, dão aos alunos todos os direitos, inclusive o de não fazerem e o de fazerem o que bem quiserem. Resultado disso: professores agredidos em salas de aulas e os “pobres vítimas da sociedade” e, diga-se, das políticas de corrupção, tratados como coitadinhos. Professor também tem filhos, maridos ou esposas, pais, parentes, problemas de saúde, sonhos, planos para o futuro etc., e, portanto, deve sim ser mais profissional educador do que agente escolar-penitenciário de sujeitos, primeiramente vítimas das políticas de dominação e cabresto imposta
à sociedade também vítima dessas primeiras. Educação vem de berço. Conhecimentos e letramentos (Alfabetização) é que se deve aprender na escola. Professor babá e agente penitenciário, NÃO!
Eu como professora da Educação Infantil construo um relacionamento afetivo com os responsáveis de minhas crianças desde o primeiro momento da primeira reunião de pais, informando a nova fase que as crianças iniciaram por meio da interação com outras crianças. Fatos novos aconteceram nesse contexto como tombos, arranhões, mordidas, trocas de toucas, chupetas e outros objetos e roupas por motivos as vezes do professor confundir a mochila, ou a criança estar alcançado autonomia. Contudo observo que os pais que comparecem nas reuniões e também o professor tem essa ideologia de vínculos de respeito com a família o ano corre bem, entre desculpas, perguntas se alguém viu uma chupeta ou touca. Um contexto relativamente normal no dia a dia com professores com 20 ou mais crianças. Tudo depende do sentimento e postura nessa construção diária com parceria, respeito e desejoso de mais acertar do que errar. Contudo minha indignação está para os pais que trabalham ou não e que não comparecem as reuniões e julgam professores desatentos e que precisam ter mais, atenção e cuidado …. o que mostra nesta fala estar subjugando o professor como irresponsável, desatento incapacitado para exercer a função. Simplesmente por uma chupeta ir na mochila errada… Para concluir vejo que muitas gestões como diretores e coordenadores possuem medo do enfrentamento deste conflito e continuam ano a pós ano com as mesmas ações que geram nos professores indignados pela falta de respeito, comodismo e conformismo “A mãe ou responsável sempre tem razão”. O que falta é orientação de direitos e deveres, de diálogo desde a matricula e novas estratégias para que os pais novos e antigos na UE Unidade Escolar construção uma relação de compreensão e respeito, ajudando os professores nomeando os pertences de seus filhos e os professores construa um relacionamento que crie essa confiança das famílias com os professores. Professora Rosemary graduada em Pedagogia, pós graduada em Psicomotricidade, aluna pesquisadora do ORCID e que realiza várias pesquisas para melhor oferecer uma educação de qualidade e humanística valorizando a singularidade de cada criança. Maravilhoso trabalho de pesquisa !!!!
Muito bem ..wagner…parabens pela matéria..
Também sou professor…e me sinto nessa pressão,e somos mais precionados pelas nossas secretarias de educação que nos diz que não é pra gente dividir a responsabilidade com os pais….gostei muito da sua matéria parabens…
Matéria perfeita. Gostaria de citá-lo no meu TCC.
O dia a dia de Servidores públicos que trabalham em contato com Pais e ou Responsáveis por alunos dentro de uma unidade escolar não poderia estar tão sintetizado numa matéria. Obrigada por compartilhar !!!