Como alicerce da pirâmide educacional, o Ensino Fundamental precisa ter uma estrutura equilibrada, do contrário resultará na fragilidade de todo o sistema.
O Brasil gasta cerca de 6% do PIB com educação, enquanto os países da OCDE cerca de 5,5%.
Há algo de estranho nessa matemática.
A coordenadora de projeto do Todos Pela Educação, Thaiane Pereira, apresenta pontos complexos que envolvem a atual situação do Ensino Fundamental do Brasil.
Portal CPP: Segundo o OCDE, Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o Brasil está entre os países que menos gastam com ensino fundamental. O total investido em universidades é praticamente quatro vezes maior do que na educação de base. O que fez o país ir ao caminho inverso de outros países?
Thaiane Pereira: Quando avaliamos o PIB investido em educação, o Brasil está perto dos países desenvolvidos dentro da média da OCDE. Mas quando avaliamos o valor investido sabendo que temos uma população imensa na proporção aluno/ano, o valor se torna discrepante. O mecanismo que temos hoje de distribuição desse valor, que o principal é o Fundeb, também pode ser melhorado. Podemos tentar fazer uma equalização para que todos os alunos, independentemente de onde estiverem, da rede de ensino, do norte ao sul, tiveram mais ou menos o mesmo valor / ano por aluno. Isso faz com que possamos equalizar melhor esse ajustamento. Mas quando olhamos o montante investido vamos na linha do que os outros países praticam. Não pode haver uma dicotomia entre investir mais ou investir melhor. As duas coisas são necessárias. O aumento do valor investido precisa ser gradual, com responsabilidade, já que é um investimento social tão importante precisa estar em linha com o crescimento do país.
A Constituição determina que os municípios priorizem o ensino infantil e fundamental e os estados cuidem do fundamental e do médio. E à União cabe manter a rede federal (ensino técnico e superior) e repassar verba para que estados e municípios cuidem da educação básica. Mas não é assim que funciona na prática. Por quê?
No geral funciona. O Brasil tem vários pontos a serem melhorados. Quando falamos da distribuição de responsabilidades entre pactos federativos, falamos de como isso se coloca nos estados e municípios. Funciona, mas é preciso melhorar. É um desafio fazer o pacto entre estados, municípios e união. Para isso precisamos aprimorar essa organização federativa por meio de uma regulamentação de um sistema nacional de educação.
Ninguém contesta que o Ensino Superior precisa ser expandido e aperfeiçoado assim como a Educação Básica. Mas se durante décadas o MEC investe muito mais com as universidades onde está o foco do problema, com os gestores que entendem de administração mas não de educação?
Dado esse cenário que não é terra arrasada, porque é positivo, mas há muitos espaços para melhoria. Podemos resumir em dois grandes desafios: o político e o técnico. Por vezes o custo político de não se dedicar à educação é baixo, porque é muito difícil ver resultados imediatos. Fazer mudanças que afeta todo mundo é demorado, as vezes não se consegue em um só mandato. Quanto ao desafio técnico, os técnicos não estão preparados para o tamanho do desafio que é fazer da política educacional. Isso vale para as secretarias e ministérios. Falta uma visão mais sistêmica. Não há uma bala de prata.
E o investimento nos professores do Ensino Fundamental? Como garantir a qualificação destes profissionais da rede pública?
Há um problema estrutural nesta carreira. Atraimos pessoas não muito bem preparadas para esses cursos. Quase 50% não recomenda a própria profissão. Quando entra nas redes de ensino o desafio continua. Há cursos, as faculdades que não estão preparados para a prática na sala de aula., pouco alinhada para que o professor vai viver no futuro. Isso acaba prejudicando que leva um choque quando entra aula. Como ele entrou com conhecimentos mais teóricos e do que práticos, quando entra nas redes de ensino o desafio continua. Precisa haver uma estruturação da carreira como um todo e as condições de trabalho desse professor. Os planos de carreira precisam ser revistos para que incentivem o desenvolvimento profissional que dialoguem com os desafios da sala de aula. As ações precisam acontecer com frequência, ter foco no conhecimento pedagógico, uso de métodos ativos para a aprendizagem, para trabalhar com problemas reais do cotidiano, atividades com participação coletivas e estruturação prolongada. Além disso, dentro da própria escola, o bom uso do próprio do 1/3, para se preparar, estudar, enfim. Já que está na lei, o professor tem isso garantido. É necessário boas práticas focadas no pedagógico de fato.