Levantamento realizado pela Rede Escola Pública e Universidade utilizou informações coletadas em 299 escolas estaduais

Na véspera do retorno às aulas presenciais nas escolas estaduais de São Paulo, levantamento elaborado por pesquisadores da Rede Escola Pública e Universidade (Repu) indica que a incidência de Covid entre professores no início deste ano foi maior do que a registrada na população em geral. Os dados foram coletados por professores ligados a Apeoesp. A nota técnica elenca ainda inconsistências nas informações sobre a infecção nas escolas divulgadas pela Secretaria da Educação da gestão João Doria (PSDB).

Hoje, sabe-se que crianças adoecem com menos gravidade e não são as principais disseminadoras do coronavírus. Estudos mostram que, se protocolos sanitários forem seguidos, o retorno pode ser seguro. Por outro lado, sindicatos de educadores, resistentes à volta sem vacinação, têm manifestado a impossibilidade de cumprimento desses protocolos diante da estrutura das escolas, o que o governo estadual nega.

Recentemente, a Secretaria Estadual da Educação divulgou boletim epidemiológico sobre as infecções por Covid na comunidade escolar entre janeiro e março e concluiu que a incidência do vírus nos colégios foi menor do que fora deles. A nota divulgada pelos pesquisadores contesta essa afirmação e outras declarações do boletim.

Ela foi elaborada pelos professores Ana Paula Corti e Leonardo Crochik, do IFSP (Instituto Federal de São Paulo), Débora Cristina Goulart, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), e Fernando Cássio e Salomão Ximenes, ambos da UFABC (federal do ABC).

A coleta dos dados analisados por eles foi feita por professores ligados a subsedes da Apeoesp. Eles levantaram informações sobre casos confirmados em 299 escolas estaduais entre 7 de fevereiro e 6 de março. Ao final do trabalho, a incidência entre os educadores foi comparada com a da população de 25 a 59 anos do estado – a escolha se justifica pelo fato de docentes com 60 anos ou mais terem permanecido em trabalho remoto. Os pesquisadores chegaram a pedir ao governo os dados oficiais de infecção especificamente em professores e funcionários, entre outros, via Lei de Acesso à Informação, mas o pedido não foi respondido sob a justificativa de que o estado já havia divulgado o boletim epidemiológico – a base de dados, incluindo detalhamento sobre infecção em professores, não foi tornada pública, no entanto.

Diante da negativa, a Repu optou por utilizar os dados coletados pelos docentes das subsedes da Apeoesp. Eles mostram que, nas unidades analisadas, a incidência de Covid-19 entre professores foi quase o triplo da registrada na população de 25 a 59 anos de São Paulo (2.256 por 100 mil habitantes contra 773,1 por 100 mil).

O levantamento revela ainda que, ao longo do período analisado, em que houve recrudescimento geral dos casos de Covid no país, o aumento da incidência entre os docentes foi de 138%, contra 81% do registrado na população comparada. O estudo pesquisou escolas em 15 municípios, dos quais 13 na região metropolitana. Os 15 na região de Arujá, Caieiras, Cajamar, Ferraz de Vasconcelos, Francisco Morato, Franco da Rocha, Guarulhos, Hortolândia, Mairiporã, Osasco, Poá, Santa Isabel, Santo André, São Paulo e Sumaré. As 299 unidades analisadas correspondem a 4% da rede estadual.

O boletim divulgado no início de março pela Secretaria da Educação da gestão Doria mostra a taxa de incidência da Covid na comunidade escolar como um todo, para concluir que ela era “33 vezes menor que a do estado”. A secretaria juntou no cálculo alunos, professores e funcionários das escolas e considerou na população geral estudantes que não chegaram a ir à escola.

Na nota técnica divulgada nesta terça-feira (13), os pesquisadores da Repu fazem outras críticas ao bletim epidemiológico. Entre elas está a decisão de calcular uma única taxa de incidência para alunos, professores e funcionários, o que dilui os números das infecções dos servidores em meio aos das crianças, que são menos propensas a desenvolver a Covid de forma grave e sintomática e representam 92,6% da população escolar.

Outra crítica ao boletim oficial é a inclusão da comunidade escolar das unidades municipais, uma vez que a notificação dos casos da rede municipal é opcional para a maioria das cidades. O jornal Folha de São Paulo indagou à Secretaria da Educação qual a incidência de casos registrados oficialmente entre professores. A pasta citou incertezas e respondeu que não foi realizado um recorte específico. “O uso de dados gerais foi o número confiável a ser utilizado diante das incertezas, como metodologia possível”, afirma a nota.

A secretaria diz ainda que o fornecimento de dados das redes municipais cabe aos municípios e que parte deles, como a capital paulista, optou por não alimentar a base. A pasta não explicou, no entanto, por que então o número de alunos da rede municipal foi incluído na população de referência do boletim.

Estudo recém apresentado pela Universidade de Zurique e pelo Banco Interamericano concluiu que a volta às aulas não afetou o ritmo da pandemia nos 131 municípios paulistas que reabriram escolas de outubro a dezembro do ano passado, na comparação com os que não abriram.

O estudo levou em consideração o dado informado pela Secretaria Estadual da Educação de que quase 2 milhões de alunos frequentaram a escola no período. A nota técnica da Repu afirma que o número está exagerado, pois muitos dos 3,6 milhões de estudantes decidiram não retornar no ano passado.

A Secretaria da Educação afirma que a frequência dos estudantes foi comprovada pelas atividades e avaliações que foram realizadas em sala de aula. Também diz que investe na segurança dos professores na volta às aulas e, por isso, já foram vacinados com a primeira dose 167.847 profissionais da área desde sábado (10).

Fonte: Folha de São Paulo