FlinkSampa será realizada entre os dias 18 e 19 de novembro, no Memorial da América Latina, em São Paulo; programação gratuita terá debates, lançamento de livros e performances, entre outras atividades

 
Não há liberdade sem igualdade. E não há igualdade sem respeito. Estas são apenas algumas das lutas que, há séculos, vêm sendo travadas pela comunidade negra em praticamente todo o mundo. No Brasil, não é diferente. Em um país no qual o preconceito e a violência ainda persistem, ganha mais força e importância a realização de um evento como a FlinkSampa – Festa do Conhecimento, Literatura e Cultura Negra, cuja quarta edição acontece entre os dias 18 e 19 de novembro, no Memorial da América Latina, em São Paulo. A partir do lema “Eu quero liberdade” serão realizados debates literários e sociais, lançamentos de livros, performances e outras atividades culturais, sempre levando em conta questões relacionadas aos direitos dos negros e a favor do fim do panorama de exclusão ainda persistente. Toda a programação é gratuita.

“O pilar central da FlinkSampa está relacionado à luta pelo direito do negro à liberdade física, de expressão individual e coletiva, de exercer qualquer trabalho ou profissão e, sobretudo, ao direito de ir e vir. O negro tem todo o direito de se movimentar em um mundo, embora muitos ainda sejam hostilizados, presos e até mortos, sem razão alguma”, reivindica o professor doutor José Vicente, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, promotora do evento em parceria com a ONG Afrobras.
 

Nesse sentido, merece destaque a escolha do homenageado desta edição, o advogado Luiz Gama. Nascido em 1830, ele é uma referência na luta pela igualdade e sua história de vida é exemplo de persistência na busca de uma formação educacional e de obstinação em defesa de seus ideais e luta pela liberdade. Além de um debate especial em sua memória, a FlinkSampa vai promover diversas outras mesas, com questões relacionadas à literatura, a aspectos sociais e ao empoderamento feminino, além do lançamento de livros, entre outras atividades. Estão confirmados centenas de convidados, entre escritores, representantes do poder público, pesquisadores e educadores, para debates, estudos e reflexões a respeito da situação do negro no Brasil.
 

De acordo com Francisca Rodrigues, presidente da FlinkSampa, são espaços como esses que podem contribuir para a transformação da realidade. “Embora muito se diga sobre o espaço conquistado, pouco se reflete sobre o que ainda nos falta. Estamos falando de direitos fundamentais, de preconceitos, de violência. A FlinkSampa se propõe a ser instrumento e palco para estas discussões. Mais do que um evento, queremos ser agentes para a construção de um futuro igualitário”.

 

SEMINÁRIO INTERNACIONAL

A quarta edição da FlinkSampa ajudará a consolidar o Seminário Internacional – Educação, Conhecimento, Diversidade e Ações Afirmativas, com o tema Liberdade: o Legado de Luiz Gama na Luta pelos Direitos da População Negra Brasileira como um importante espaço para a discussão das questões raciais, legitimando-o como ponto de referência na luta pela igualdade dos negros. Com curadoria da professora Eliane Almeida, já estão confirmados nomes como Fábio Coelho, presidente do Google Brasil; Oswaldo Faustino, jornalista e escritor; e Marcos da Costa, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo. 

Participam ainda importantes nomes ligados ao segmento acadêmico, como o Prof. Dr. Patrício Carneiro (PUC-SP), Prof. Dr. Victor Kajibanga (Univ. Luanda), Phd Rhoda Arrindell (Dutch Saint Maarteen) e Macaé Evaristo (Secretária de Educação do Estado de Minas Gerais).

Um exemplo da força e atualidade do evento será a realização da mesa Viver em Liberdade: a questão dos refugiados. Dela participarão a professora Isabelle Dias Carneiro Santos; Madsen Cherubin, embaixador do Haiti no Brasil; Orlando Manuel José Fernandes da Mara, reitor da Universidade Agostinho Neto (Luanda, Angola); Paulo Daniel Elias Farah, diretor-presidente do BibliaSPA, ONG que oferece cursos de línguas para estrangeiros de origem árabe e refugiados; e Tânia Aparecida Rodrigues, secretária executiva do MinC.

“Desde o final do século XIX, o Brasil ficou conhecido no mundo como o país do futuro. Abriu suas portas e recebeu imigrantes de diversas partes da Europa e Ásia. Somos um país pluricultural por conta dessas imensas populações que encontraram em terras brasileiras, a possibilidade de se estabelecer e construir suas vidas com segurança e dignidade. Mas o fluxo de imigrantes que surge no Brasil da atualidade têm perfis diferentes. São refugiados caribenhos, africanos oriundos da mesma diáspora que hoje buscam colo neste seio. Mas o tratamento é desigual e tão preconceituoso quanto em tempos de escravidão. É neste contexto que a mesa se concentrará”, explica a curadora do espaço.
 

DEBATES LITERÁRIOS

A curadoria de Literatura da quarta FlinkSampa será feita pela professora e escritora Guiomar de Grammont, que, em 2015, dividiu o espaço com o professor Uelinton Alves. A mesa de abertura, que acontece no dia 18 de novembro, resgatará a trajetória do homenageado, Luiz Gama, e a luta dos negros pela liberdade. Dela participarão a professora Ligia Ferreira e o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, mediados pela professora Maria Helena Machado (USP).  

Entre os brasileiros, já estão também confirmados nomes como Ana Paula Maia, Ferréz e Paulo Lins. Já em âmbito internacional, estarão presentes Antônio Quino e Maria Celestina Fernandes, de Angola; Futhi Ntshingila, da África do Sul; Glaucia Nogueira, de Cabo Verde; Jean-Paul Delfino, da França; Carlos Moore e Teresa Cárdenas, de Cuba; Kangni Alem, do Togo; e Milagros Carazas, do Peru.

 

O HOMENAGEADO

Luiz Gama nasceu livre, na Bahia, em plena era da escravidão no Brasil. Filho da negra Luiza Mahin, que participou de diversas insurreições de escravos; aos 10 anos, foi vendido como escravo pelo próprio pai, um fidalgo português. Luiz Gama alfabetizou-se como pôde, escapou do cativeiro e tentou ingressar no Curso de Direito do Largo do São Francisco – hoje denominada Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Por ser negro, enfrentou a hostilidade de professores e alunos, mas persistiu como ouvinte das aulas. Não concluiu o curso, mas o conhecimento adquirido permitiu que dedicasse sua vida à defesa jurídica de negros escravos.

Nos Tribunais, usando de sua oratória impecável e de seus conhecimentos jurídicos, conseguiu libertar mais de 500 escravos, algumas estimativas falam em 1000 escravos. As causas eram diversas, muitas envolviam negros que podiam pagar cartas de alforria, mas eram impedidos pelos seus senhores de serem libertos; outros, haviam entrado no território nacional como escravos após a proibição do tráfico negreiro em 1850. Luiz Gama também ganhou notoriedade por defender que, ao matar seu senhor, o escravo agia em legítima defesa.

Luiz Gama, um dos maiores líderes abolicionistas do Brasil, sempre esteve engajado nos movimentos contra a escravidão e a favor da liberdade dos negros. Devido à sua luta a favor da libertação dos escravos, era hostilizado pelo Partido Conservador e chegou a ser demitido do cargo de amanuense por motivos políticos. Na década de 1860 destacou-se como jornalista e colaborador de diversos periódicos progressistas. Em 1869, fundou com Rui Barbosa o Jornal Radical Paulistano. Em 1880, foi líder da Mocidade Abolicionista e Republicana. Projetou-se na literatura com poemas que satirizam a aristocracia e os poderosos de seu tempo. Hoje, é reconhecido como um dos grandes escritores da segunda geração do romantismo brasileiro.

CONCURSOS

Uma ação inédita promovida pela FlinkSampa será o Prêmio Flink de Literatura. O objetivo é revelar novos talentos e promover a literatura produzida por jovens autores negros brasileiros e residentes no país. Poderão concorrer romances inéditos, destinados ao público adulto e escritos em língua portuguesa. O regulamento já está disponível no site do evento (www.flinksampa.com.br), e as inscrições poderão ser feitas de 2 agosto a 2 de setembro. Os três primeiros colocados terão seus livros editados, em um volume único, com todas as despesas financiadas pela Afrobras. A curadora de Literatura, a escritora Guiomar de Grammont, afirma: “Iniciativas como estas são fundamentais para a diversidade literária e para a descoberta de novas vozes para a produção contemporânea”.
 

Outra importante iniciativa promovida pela FlinkSampa será a realização do Prêmio Internacional de Investigação Histórica Agostinho Neto, realizado por meio da parceria firmada entre o reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, doutor José Vicente; e a presidente do Conselho de Administração da Fundação Dr. Antônio Agostinho Neto, doutora Irene Neto. De acordo com o protocolo de intenções, assinado em novembro de 2014, a premiação será bianual e tem como objetivo premiar trabalhos que promovam melhor conhecimento do universo da vida e da obra de Antônio Agostinho Neto (1922-79), fundador da República de Angola, da qual foi seu primeiro presidente.
 

O prêmio é composto de um júri de sete membros, formado por, além do presidente, Alberto Oliveira Pinto, de Angola, pela professora Ana Paula Tavares (Angola), pelo reitor José Vicente e pelo professor Uelinton Farias Alves, ambos do Brasil, e pelo professor Jean-Michel Mabeko-Tali, representando o apoio da UNESCO, pela professora Vanicléia Silva Santos, também do Brasil, e, por último, por Irene Alexandra da Silva Neto.

 

QUEM FOI ANTÓNIO AGOSTINHO NETO

Antônio Agostinho Neto nasceu na aldeia de Kaxicane, região de Icolo e Bengo, a cerca de 60 km de Luanda, filho de uma professora e de um professor e pastor da Igreja Metodista. Foi médico, poeta, político e primeiro presidente de Angola.

Envolveu-se desde cedo com atividades políticas. Foi representante da Juventude das colônias portuguesas no Movimento da Juventude Portuguesa, o MUD juvenil e um dos fundadores do Movimento Anticolonial (MAC), que reunia participantes de Angola, Guiné, Cabo Verde, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Foi eleito Presidente Honorário e, posteriormente, presidente do Movimento Popular de Libertação de Angola – MPLA. Pela sua participação em atividades anticoloniais foi preso diversas vezes, tendo passado por prisões em Portugal e Cabo Verde.

Como representante do MPLA, participou, em 1975, em Portugal, da assinatura do acordo para a formação do “governo de transição”. E em 11 de novembro de 1975, proclamou a independência de Angola. Dirigiu o MPLA e foi o primeiro presidente de Angola durante os primeiros anos de independência. Morreu em 10 de Setembro de 1979, em Moscou, na União Soviética.

Mais informações sobre o evento estão disponíveis em www.flinksampa.com.br