Fim do Fundeb representaria retrocesso da universalização da educação básica obrigatória
Um dos assuntos mais acessados no Portal CPP é um possível fim da vigência do Fundeb, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação.
Instituído pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006, em substituição ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), criado em 1996, é gerado pelos impostos e pelas transferências obrigatórias aos estados, Distrito Federal e municípios brasileiros.
A União também complementa em alguns estados, o que, no ano passado, representou R$ 13 bilhões. Ano passado, o Fundeb distribuiu R$ 148 bilhões em recursos à educação básica, da creche ao ensino médio, além do pagamento dos professores da rede pública em todo o país.
Para explicar a importância do Fundeb, o Portal do CPP entrevistou Caio Callegari, bacharel em Economia pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), com intercâmbio acadêmico na University of Groningen, na Holanda. Como Coordenador de Projetos do Movimento Todos Pela Educação, é responsável por liderar os esforços de aprimoramento do Fundeb e realizar estudos sobre desigualdades educacionais.
Portal CPP: O Fundeb tem prazo de validade até 31 de dezembro de 2020. Quais os reais riscos de não ser renovado?
Caio Callegari: Um eventual fim representaria, em primeiro lugar, um caos em boa parte das redes de ensino do país. Sem recursos do Fundeb não teriam como pagar os professores adequadamente, nem teriam condições de pagar funcionários, nem como fazer manutenção escolar, merendas, transporte. Portanto, para boa parte das redes do país que operam as suas redes basicamente com recursos do Fundeb, o fim da política seria algo extremamente deletério do ponto de vista da construção cotidiana da educação. Além disso, correríamos o risco de dar passos largos para trás, um retrocesso em duas questões principais. A primeira é a universalização da educação básica obrigatória.
O Fundeb, que vem na sequência do Fundef, criado em 1996, para garantir recurso por aluno, apoiou a universalização básica obrigatória, que embora ainda não esteja finalizada, avançou muito nas últimas décadas. Por isso, o fim do Fundeb representaria uma quebra no trabalho de universalização da educação básica obrigatória. A segunda seria a volta de uma enorme desigualdade de condições de oferta de ensino entre as redes educacionais brasileiras.
O Fundeb tem um efeito Robin Wood, que tira de quem tem mais dinheiro por aluno para dar para quem tem menos dinheiro por aluno, equalizando, portanto, as condições de oferta.
Se voltássemos ao cenário sem o Fundeb, veríamos ao menos a triplicação da nossa desigualdade educacional em termos de recursos do que as redes têm para investir em educação.
Quais as propostas para assegurar a aplicação dos recursos dos fundos para a remuneração e valorização dos profissionais da educação?
Uma boa parte das redes do país gasta mais do que 60% dos recursos do Fundeb na remuneração dos professores. Quando vemos a perspectiva de continuidade do fundo, essa garantia de recursos destinados à remuneração dos professores tem que continuar, porque é algo positivo. Afinal, o Fundeb significa Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação.
Se for renovado, o que deveria ser incluído ou retirado do atual Fundeb?
Em primeiro lugar, o Fundeb deve se tornar permanente. O caráter que tem hoje, transitório, coloca em risco a execução da operação básica do ensino brasileiro. O Fundeb tem característica de política de estado, cujos efeitos não podem ser retrocedidos. Os outros recursos vinculados ao Fundeb são muito concentrados em alguns municípios. Precisamos pensar num Fundeb que ataque as desigualdades educacionais. Além disso, temos outro desafio: quando pensamos no Fundeb como algo que busca garantir a equidade, a universalização da educação básica, vemos que a população menos atendida é a população mais pobre do país. Na verdade, é importante estimular uma busca ativa das suas crianças e jovens mais pobres, e trabalhar para evitar a evasão desses alunos.
Há duas PECs em tramitação no Senado. Uma propondo 30% e outra 40% de complementação. Como é que o Todos Pela Educação visualiza esses números?
O Todos Pela Educação tem trabalhado nos últimos dois anos e meio construindo propostas, simulações, estudos técnicos sobre desenhos possíveis para o Fundeb. Nosso entendimento é que a complementação da União deve aumentar sim, a União deve participar mais porque, mesmo tornando o Fundeb mais distribuitivo, se não aumentarmos o valor de contribuição da União, ainda temos um contingente grande de redes de ensino no país com recursos muito baixos para garantir uma educação de qualidade. Em relação aos números, todos sinalizam para um esforço bastante ampliado da União. O que temos estudado é que vamos ter que aumentar, será uma negociação difícil com o governo, nesse momento de crise fiscal. Precisamos ter o compromisso de garantir, ao menos um aumento de 10% a 15% de complementação da União. Se vai ser 20%, 30% ou 40%, isso é do nosso debate. Não pode vir uma proposta do governo federal abaixo de 15% porque essa proposta significaria mesmo que o Fundeb se tornasse mais distribuitivo, que boa parte das redes de ensino do país teriam menos de R$ 4 milpor aluno/ ano – um valor muito baixo .
Que mensagem você pode deixar aos associados do CPP, aos profissionais da educação atentos para o Fundeb?
Precisamos ter um compromisso do estado brasileiro para garantir oportunidades educacionais iguais para todos.
Eu vejo que o fundeb, não pode acabar, tem que continuar, para o complemento de renda dos estado e município. Se não os gestores nunca vai conseguir pagar suas contas.