No aniversário de São Paulo, nós, paulistanos de berço ou de coração, procuramos sempre prestigiar nossa cidade.

Acompanhe a seguir o texto delicioso do consagrado paulistano Marcelo Duarte.

Parabéns a você, São Paulo!
Por Marcelo Duarte

Vamos cantar “parabéns” em homenagem à querida cidade de São Paulo? Serão 468 anos neste 25 de janeiro. O curioso é que o “Parabéns a Você”, a música mais executada há anos no país, e o aniversário de São Paulo têm uma forte ligação – e muito provavelmente você nem imagine qual seja. A letra em português, que irá completar 80 anos no início de fevereiro, pegou de vez quando foi cantada por uma multidão de paulistanos na festa do IV Centenário de São Paulo, em 1954. Antes disso, ela não tinha a menor importância.

Os versos foram escritos por Bertha Celeste Homem de Mello, uma dona de casa de Pindamonhangaba, a 158 quilômetros da capital, para o concurso de uma rádio do Rio de Janeiro. Bertha estava prestes a completar 40 anos. Ela gostava de dizer que a ideia brotou em apenas 5 minutos. Bertha usou o pseudônimo de Léa Magalhães para participar. Conto essa história inteirinha no livro “Parabéns a Você”, um romance juvenil que mistura ficção e realidade, com lançamento marcado para a próxima semana.

O cantor, compositor e radialista carioca Henrique Foréis Domingues, conhecido pelo apelido de “Almirante”, era um profundo defensor da música brasileira. Ele se sentia incomodado com aquela história de ficarmos cantando em inglês: “Happy Birthday To You”. Almirante ouviu essa música pela primeira vez em 1937 no Cassino da Urca, no Rio de Janeiro, local onde as pessoas iam para jogar e assistir a grandes espetáculos. Ela foi entoada por um grupo de turistas americanos para homenagear um aniversariante. A partir daí, sempre que alguém fazia aniversário, o maestro Vicente Paiva, que comandava a orquestra do Cassino, pedia para apagar as luzes e tocava o “Happy Birthday To You”. O público cantava mesmo sem saber direito a letra. Por isso, em outubro de 1941, Almirante decidiu promover um concurso para escolher uma letra em português.

O “é pique, é pique/é hora, é hora, é hora/rá-tim-bum” foi criado em São Paulo e não tem nada a ver com Bertha. A autoria desta “parte final” é atribuída a alunos da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, no centro de São Paulo, na década de 1930 – antes, portanto, do concurso de Almirante.

O que se conta é que o “é pique/é pique” veio do apelido “Pic-Pic” do estudante Ubirajara Martins de Souza, que vivia com uma tesourinha aparando a barba e o bigode pontiagudo. Esses mesmos estudantes frequentavam o restaurante Ponto Chic, no Largo do Paissandu, no centro da cidade. Precisavam esperar meia hora para tomar uma nova rodada de cerveja, que era o tempo que a bebida levava para resfriar nas barras de gelo. Quando dava os 30 minutos, eles cantarolavam para os garçons: “É meia hora, é hora, é hora, é hora”.  Por fim, o “Rá-Tim-Bum” seria uma referência à visita de um rajá indiano cujo nome tinha a sonoridade parecida com Timbum. Os alunos fizeram uma colagem de todos esses gritos de guerra fanfarrões, que ficou assim: “Pic-pic, pic-pic; meia hora, é hora, é hora, é hora; rá, já, tim, bum”. Mas como essa brincadeira foi parar no “Parabéns a você” ? Populares, os estudantes eram sempre convidados para animar festas de aniversário. Aproveitavam para entonar seus bordões.

Assim fica explicado por que não podemos deixar de celebrar o aniversário de São Paulo com um uníssono “Parabéns a Você”. A cidade merece!


Marcelo Duarte, paulistano de Pinheiros, é jornalista e escritor. Lançou a série “O guia dos curiosos”, hoje com dez volumes, e também é autor de romances juvenis. O mais recente é “Parabéns a Você” (Panda Books). Tem um programa semanal de curiosidades no canal do Guia dos Curiosos do YouTube. Está nas principais redes sociais como @guiadoscuriosos.