João Gabriel do Nascimento, de 10 anos, executa, com razoável desenvoltura, Águas de Março, de Tom Jobim, ao violino. Com dores no pescoço, diz, em tom de brincadeira, que está se sentindo como o astrofísico inglês Stephen Hawking. Filho de uma diarista e um pizzaiolo, João mora no Morro do Cerro Corá, no Cosme Velho, Rio de Janeiro; estuda na Escola Municipal José de Alencar, em Laranjeiras, e aprendeu a ler, sozinho, aos quatro anos. Quando crescer, ainda não sabe se vai ser escritor ou goleiro do Flamengo.

Gustavo Torres da Silva, de 18 anos, é aluno de Engenharia Física na Universidade de Stanford, nos EUA. Nascido no Capão Redondo, bairro pobre da periferia de São Paulo, Gustavo foi aprovado em duas instituições brasileiras – USP, em Engenharia Elétrica, e UFSCar, em Engenharia Física – e cinco americanas: Columbia, Duke, MIT, Harvard e Stanford. Na infância, gostava de ver o pai, técnico de eletrônica, montar e desmontar os eletrodomésticos que trazia para casa.

O que os dois têm em comum? São alunos com altas habilidades, mais conhecidos como superdotados.

Para ser considerado um superdotado, explica a pedagoga Maria Clara Sodré, PhD em Educação pela Universidade de Columbia (EUA), o aluno precisa apresentar, entre outras características, precocidade ou alto potencial em pelo menos uma das sete inteligências definidas pelo psicólogo americano Howard Gardner em sua Teoria das Inteligências Múltiplas.

Em outras palavras: ele precisa ter uma habilidade muito acima da esperada para a sua idade.

No caso de João, sua inteligência é a musical. Como Sivuca e Hermeto Paschoal, dois dos mais virtuosos artistas brasileiros, o menino consegue extrair timbres e sons de qualquer instrumento – musical ou não.

Já a inteligência do Gustavo é a lógico-matemática. Incentivado por seu pai, Adalberto, o garoto gostava de desparafusar o joystick do videogame para ver como funcionava por dentro.

Garimpando talentos

Na maioria das vezes, quem “garimpa” esses diamantes brutos é a própria família. É o caso de Gustavo, que atribui todo o mérito de suas conquistas acadêmicas ao esforço incansável dos pais.

“Se eles não me tivessem dado livros para ler, quebra-cabeças para montar e cursos para estudar, eu não teria chegado tão longe”, reconhece o rapaz.

Em alguns casos, é o professor, em sala de aula, o primeiro a detectá-los.

Foi o que aconteceu com Tauat dos Santos Lara, de 14 anos. Quando estudava na Escola Municipal Minas Gerais, na Urca, Zona Sul do Rio, era sempre o primeiro a terminar os exercícios.

“Um dia, a professora de Matemática me indicou livros mais avançados. E até sugeriu que eu pulasse de série”, recorda Tauat. Hoje aluno do 9º ano do Colégio Pedro 2º, Tauat é tricampeão nas Olimpíadas de Matemática das escolas públicas.

Em casa ou no colégio, os sinais são sempre os mesmos. “Aprendem com rapidez, gostam de fazer perguntas, têm excelente memória, apresentam rico vocabulário e tiram notas boas”, enumera a psicóloga Cristina Delou, doutora em Educação pela PUC-SP e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Desde 2014, Delou já capacitou 200 professores da rede pública do Rio de Janeiro para reconhecer superdotados.

Os alunos que se destacam dos demais, por terem pensamento lógico, facilidade de aprendizado ou senso de justiça, entre outros atributos, são avaliados por um psicólogo ou um psicopedagogo, através de testes específicos de conhecimento.

Feito o diagnóstico, o estudante é encaminhado a um instituto especializado para aprimorar seu talento.

“Os mitos relacionados à superdotação são incontáveis: uns dizem que eles são gênios, outros, que são bons em tudo e outros, ainda, que não precisam de ajuda. Sem orientação adequada, muitos deles perdem o interesse nos estudos e abandonam a escola”, explica Inês França, gerente de projetos do instituto Ismart, que atua auxiliando superdotados do Rio.

 

Com informações do UOL/Educação